Primeiramente, ALELUIA, consegui assistir este filme... yay! Três vivas pra mim mesmo!

E, segundamente, uma historinha:

Eu gosto de tirar fotografias. Como estou de "férias", estava com a minha câmera quando fui comprar os ingressos do filme. Quando saía do shopping, resolvi fazer uma foto de uma das placas do estacionamento.

Enquanto enquadrava a foto, um segurança passou por mim, falando nervoso no seu walkie-talkie. Minutos depois, outro me abordou, sem graça:

- Tudo bem?
- Tudo...
- Você está tirando foto de algum carro?
- Não, por quê?
- N-nada, só perguntando mesmo.

E saiu, ainda mais desconfortável do que estava.

Antes disso, durante minha estada, vi várias coisas que queria ter fotografado: crianças brincando na mini-creche que fizeram debaixo das esteiras rolantes; O parque de diversões instalado ao lado do shopping. Desisti das crianças pois, com certeza, os seguranças pensariam que sou um pedófilo ou coisa assim. Quando fotografava o parque, um funcionário do shopping, de patins, ficava me olhando meio torto...

Estou contando esta coisa toda porque fiquei chateado de ver o quanto as pessoas andam paranóicas. Algumas até sabem o quanto isto é ruim, como o segurança que me abordou no estacionamento: era como se ele estivesse com vergonha de me fazer aquela pergunta idiota. Esta paranóia é um dos assuntos abordados em Fahrenheit 9/11. E, se no Brasil estamos nesse nível, imagine só os norte-americanos...

Para falar um pouco mais do filme, comecemos pelo título, que parodia o nome de um livro de Ray Bradbury, chamado Fahrenheit 451. Traduzindo o que dizem da história do livro:

Em Fahrenheit 451, na visão clássica e assustadora de Ray Bradbury, os bombeiros não apagam incêndios - eles os provocam, para queimar livros. A sociedade, vividamente pintada por Bradbury, sustenta a aparente felicidade como principal objetivo - onde informação trivial é boa, enquanto conhecimento e ideais são ruins

Michael Moore pinta uma visão ainda mais catastrófica da sociedade, colocando como ator principal o velho conhecido de todos, George W. Bush. Mas Moore pinta uma visão desesperadora, inacreditavelmente chocante, dos Estados Unidos. Eu tive pena dos americanos. Se 50% do documentário for verdade, eu realmente não sei em que mundo meus filhos nascerão.

A "arma de destruição em massa" de Moore (perdoem o clichê, eu, hã, "não encontrei" outro melhor) é a magistral edição do filme. Moore, com colossal maestria, soube misturar a comédia com o drama, com a realidade chocante, mostrando onde devia mostrar e escondendo onde devia esconder, como por exemplo nas não-cenas do 11 de setembro. Nunca achei que fosse dizer isso, mas a forma com que ele retratou o 11 de setembro foi belíssima.

O filme inteiro é uma belíssima e marcante tragédia. Eu jamais vou me esquecer (lá vem um semi-spoiler, não leia se não tiver visto o filme) da fantástica cena onde a carnificina no Iraque é mostrada, com sangue, explosões, mutilados, tudo real e deprimente. Na sequência, quando você não aguenta mais ver tanto sofrimento, aparece Britney Spears. Ela dá uma, duas, três mascadas no seu chiclete e diz, no melhor tom loura-burra que existe: "Eu concordo com as ações do presidente". Esta, meus caros, é a cena mais perfeita que já vi na história do cinema. Os melhores atores e atrizes do mundo jamais fariam melhor. Essa cena, sozinha, vale o ingresso. Se você estiver acompanhado, a cena onde Bush é informado que "o país está sob ataque" e não faz absolutamente NADA, paga o outro ingresso.

Destaque para o trabalho genial de Moore também na trilha sonora do documentário: parecia que Shiny Happy People, do REM, foi feita especialmente para a cena onde foi usada. Pena não terem legendado as músicas. E destaque para o bom humor do documentário: sim, você ri em Fahrenheit 9/11. Ri da irreverência de Moore. Ri para não chorar.

A saída do cinema, após o filme, foi silenciosa. Parecíamos todos que estávamos saindo de um enterro. Na verdade, parecia que todos haviam percebido o que o segurança do shopping, o que me abordou, percebeu: que somos marionetes de um sistema falido. Todos nós, não somente os americanos.

Em suma, tomando como cobaia eu mesmo, que nem sou tão político assim, me senti extremamente compelido a me alistar nas fileiras da turma "anti-bush". Se este é o objetivo do documentário, Michael Moore vai cumprí-lo com muita facilidade. Fahrenheit tem um conteúdo bombástico somado à edição simplesmente perfeita. Para dizer que eu recomendo muito, mas muito mesmo, transcrevo as palavras de Bethania:

"Nossa Zé... esse filme é uma relíqua... você vai baixá-lo da Internet né? Quero ver de novo..."

P.s.: Antes do filme começar, vimos o trailer de um tal filme chamado Cellular. É um clone do Por Um Fio, tem um assassino, um transeunte e um telefonema que nunca acaba. Só que o trailer foi, foi, e foi indo... e mostrando, e mostrando... até que o pessoal que estava sentado atrás de mim começou:

- Ei, mas tá mostrando o filme todo!!
- Putz, nem preciso ir ver o filme mais...

E, nessa onda anti-bush, acabamos tendo como brinde um "anti-trailer".